O rosto estrebuchado e sangrando da prostituta asiática morta estrangulada em Las Vegas, lembrava o rosto de Willhelm quando passava tempo de mais com o velho
Jack Daniels.
Lembrava também o rosto de Willhelm quando este perdeu um olho.
Coisas da guerra.
Uma mão segurando o olho dependurado por uns 2 centímetros abaixo de onde deveria estar o olho. E a outra segurando sua primeira arma, que utilizava como último recurso, que explodia a cada tiro, até o sexto e último.
Willhelm saiu vivo dessa. Mas isso não significava nada bom. Ainda assim, ele perdera um olho atingido por estilhaços de granada.
Willhelm, poderia até entender os motivos da guerra, mas ele não queria.
Se fosse para guerrear, guerrearia, adorava fazer aquilo. E faria, é claro, para os mocinhos.
América.
Enquanto escreve, Willhelm pensou em chorar pela Japonesa. Não passou disso, um gole do velho Jack e ele já tem coragem para pular um capítulo e falar sobre a guerra.
Sim, ele amava beber. E não bebia só por isso. Bebia porque se tornava um homem mais forte e menos sentimental ( adjetivo deplorável no dicionário de Willhelm), e entre outras coisas, porque era dependente física e mentalmente disso.
Não era um vício como o cigarro ou cartas ( que também estavam intrincados na alma de Willhelm). Era um vício que o completava. Um vício que era virtude.
Tinha marcas de guerra ? Sim. Não tinha um olho, o esquerdo, era levemente e astuciosamente manco, e claro, haviam as lembranças.
Como a maioria das pessoas, Willhelm sente até hoje as marcas da guerra.
Como a minoria das pessoas, Willhelm consegue dormir tranqüilo até hoje.
Ele amara os tempos de guerra. As bebedeiras, as brigas de faca, as cidades vazias, a vida melhorara muito desde o doze anos...
Mas, ele não foi recrutado.
Era só mais uma pessoa tentando sobreviver na América, agora, arrasada.
Ele não entendera muito bem, mas havia alguns soldados nas ruas ( não Americanos), matando gente.
Ele não entendera muito bem, mas parecia que todos os Estados Unidos da América haviam sido invadidos.
Ele não entendera muito bem, mas seu país parecia estar tomando medidas drásticas.
Podia ser o efeito do velho Jack, não seria a primeira vez, mas era tudo tão real.
"Que se dane", pensou Willhelm, assistindo na Tv, milhares de soldados de olhos puxados matando americanos, e ao mesmo tempo levando o copo a boca, sem perceber estar vazio.
"Que se dane", reproduziu Willhelm no seu caderno, agora com um sorriso enferrujado e amarelo e ao mesmo tempo o mais sarcástico do mundo.
Willhelm, não sabia, mas estava certo, sempre estava.
Seja em 2022 ou 2070, danação seria um conceito presente em cada dia de sua vida miserável.
"Que se dane", escrevia Willhelm, com um sorriso amarelo de escárnio e uma reflexão:
Como a unica vida da terra poderia, de algum modo, ter sido a dele ?