quinta-feira, 28 de julho de 2011

Conto- Metáfora

"-Às vezes, meu caro, é o próprio mundo é que ferra com você. É natural. Não que seja tudo sem sentido, mas a realidade as vezes é cheia de problemas, e o melhor a fazer nessas horas e apenas olhar para o céu observando a sua fraqueza e colocar aquele velho sorriso enferrujado no rosto de novo...

- Tem certeza ?

- É claro que não. "



Eu era um cara perdido nessa terra de ninguém, não se preocupe em saber como eu fui parar aqui, conforme-se com o fato de que estou num lugar que nunca vi antes, mais especificamente, numa espécie de Canionn, bem grande para falar a verdade.
E conforme-se que meu nome não é importante, aliás, se conformar com o que se vê aqui é o máximo que você pode fazer ante as coisas que contarei...
Como disse, estava preso nesse Canionn, por motivos desconhecidos, e como qualquer pessoa faria, decidi andar, encontrar o "contato humano"

Caminhei por alguns minutos por aquele chão inusitadamente pedregoso demais, quente demais e ermo demais, onde a voz poderia ecoar infinitamente. Essa era a impressão que eu tinha do lugar.
Um leve declínio de terra naquela planície chamou minha atenção, e uma ideia boba se instalou na minha mente :

Se há uma saída daqui, ela estaria naquela direção

Parti para lá com certa alegria em meu coração, nem sei o motivo de estar sentido tudo isso, mas sei que sentia.
Ao descer, tudo parecia escuro, como se a noite chegasse de repente, me surpreendendo, ou melhor, nos surpreendendo, pois afinal, eu não estava sozinho.

Foi aí que aquele velho me encontrou, ou eu quem o encontrei. Até hoje não sei dizer o que aconteceu realmente ali naquela hora e momento. Ele olhou para minha face e para meus olhos e naquele momento, antes de eu falar alguma coisa, pronto para culpá-lo, ou culpar alguém pela minha falta de direção ele me disse exatamente o que eu já disse :


-Às vezes, meu caro, é o próprio mundo é que ferra com você. É natural. Não que seja tudo sem sentido, mas a realidade as vezes é cheia de problemas, e o melhor a fazer nessas horas e apenas olhar para o céu observando a sua fraqueza e colocar aquele velho sorriso enferrujado no rosto de novo...

- Tem certeza ?

- É claro que não.


Depois disso, um riso de uma boca desdentada ele se levanta e o mundo ao meu redor começa a ser destruído, pedacinho por pedacinho...

"tem certeza ?
não
tem certeza ?
não"

O som dessa frase ecoou em minha mente enquanto via a destruição total do mundo à minha volta, apenas eu restei, agora bufando, em uma cama, suado:

Havia acordado de um sonho incomum, agora com uma mensagem gravada na mente.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

O idiota

Busco pelo o que não me corresponde,
na busca pelo impossível, pela verdadeira poesia,
sou um idiota, que sonha demais.

Minha alma suja, e meus olhos,
tudo o que sinto é apenas imagem,
passada pelo meu espírito que maculou sua natureza verdadeira.

Em versos desmancho minha confissão,
um palhaço, um bobo,
que sente prazer em ser um idiota.

É necessário ser esse idiota.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

E ao pó

O dia chegará e ninguém mais nos cegará,
quando repousarmos e jazermos debaixo do chão,
aquele que não sabe, eis que saberá,
o que disse Sim, aprendera a ouvir o Não.


Pouquíssima coisa podemos.
Lembrem-se, podemos menos ainda com a morte



O invencível Borges.

I-Uma breve apresentação do dia e do homem ilustre daquele dia.

Borges acendeu luminosamente seu cigarro de filtro amarelo num banco de praça comum, numa cidade comum.
Borges era um homem incomum. Chupou com força o cigarro, cuja ponta se avermelhou e nesse instante os cancerígenos atingiram seu pulmão octogenário.Porém, Borges tinha aspirações juvenis demais pra um pulmão tão velho.
Duas tosses, uma ajeitada em seu terno de linho preto que repousava debaixo de um sobretudo cinzento.

Cinzento era o dia...Com nuvens obscurecendo as cabeças de todo mundo debaixo de céu, inclusive Borges, que era apenas um homem.
O sol iluminava as calçadas com seus calhambeques e pessoas apressadas à caminho de seus ofícios, ou casas, ou quem sabe, pois afinal, que se pode dizer sobre a alma pelo semblante ?

II- O cigarro de Borges

Alguns passos à frente de seu banco, atravessando à rua e o cigarro ainda na boca. Uma buzina, um carro em alta velocidade, o velho Borges grita e o cigarro cai no chão, liberando suas cinzas flamejantes.

O corpo flácido de Borges cai na rua, massacrado pelo capô de um Rolls Royce 1930, cuspindo seus fluídos. Um homem incomum, fumava um cigarro, pensando em si mesmo, num ato de malícia, saiu confiante de seu banco com uma risada ecoante pela alma, quando atingido por um carro que fez questão de lhe quebrar algumas costelas e, pela força do impacto, arrancar seus olhos que jaziam agora perto de seu cigarro.

Carregaram o corpo. Ninguém se importa.Ele morre.

III- Alguém que se importa.

"Eu te amo"

Estas palavras atingiram o pobre ouvido do jovem Borges numa primavera de 1912, de uma jovem como ele.
As palavras criaram raízes na mente fraca e cheia de necessidades de nosso Borges, que de um momento para cá não tinha nada, e agora tinha pouco.

No seu ter pouco Borges imaginava-se como o maior sultão.
Ele tinha a paixão de uma jovem, tudo bem, mas Borges agora queria o mundo todo.

IV- Diário



"E tu és apenas uma pessoa que anda
manchado das coisas da vida e de sua própria sujeira
Você nos decepcionou a todos,
filho, o que Fizemos ?
Na música, que é cada ato seu,
a cada nota, a cada passo
você passa
e exala
sua presença.

Tudo o que fez está feito
e tudo o que foi feito vai passar
e o tempo há de trabalhar
para todos, isso é certeza.

Mas pra você é um talvez.


Que fina essência,
que proparoxítona
que paradoxo
que alta infecção octogenária poderia lhe descrever melhor ?

Você tosse, doente
e eu olho o sol
poente. E sorrio como quem vê o sol nascente
Você tosse
e sorri também...

E sol (poente) queima nossa pele, pois vivemos juntos.
Próximos. Apesar de tudo parecer distante.
O Céu e as estrelas
o Amor
a fé, o conhecimento e o sofrimento.
Eram longínquos

Foi um rei, foi um assassino
foi tudo e o que poderia ser tudo,
lutou para ser o Nada e nada conseguiu

Eu sua gênese, ah, Eu me lembro...

Brotaste como a mais bela das flores.
Do nada...
Do mais sujo lodo,
no mais belo jardim
numa noite estrelada
em que os furos no céu
e seus irmãos riram-se todos,
e o primeiro dos gritos do mundo foi ouvido até na outra borda do salão."


Borges se Imaginava como poeta. Mas não o era. Se imaginava como um deus artista e compôs essa canção para ' o resto dos homens ' ,em seu diário, como costumava nos chamar. Os homens comuns, sem nada. Perto dele, mero pó.
Borges cresceu, nunca amou ninguém, sua arrogância pelo resto de nós cresceu mais, um carro o atropelou, e nem no momento de sua morte, Borges viu que era um homem.
Nós vimos, eu pude ver. Suas tripas e seu sangue eram monumentalmente humanos, assim como o cheiro.



quinta-feira, 14 de julho de 2011

Vaidade

Vãos tempos que são os tempos dos sãos.
Vai o tempo de quem admirava o tempo.
E sai da cena de um teatro insano, nossa fraqueza real,
e no palco, que (não se iluda) é a nossa alma,
entra dançando, um Bobo, cria de Dite que em nós inflama a mentira
que queima nossas entranhas e nos consome num prazer efêmero e irreal.




quinta-feira, 7 de julho de 2011

De que seve a loucura, de que serve as insanidades ?
De nada servem à quem vive.
O Mar da razão é mais tempestuoso do que o da loucura.
Como tudo nesse espaço de relógio do universo,
desgraças são maiores que as bem aventuranças...

Superfícies

Os vapores exalados pela manhã do dia,
pelo andar do universo e suas estrelas,
pela beleza da natura em sua perfeição,
as sombras e as essências das coisas,
não são nada comparada ao Deus que em mim está,
à centelha de Sublime que permanece nas almas dos homens,
e me faz cantar ao contemplar às obras que não são minhas,
e na busca do saber é triste.Mas verdadeiro.

O mundo é belo.
A vida e o milagre da existência se abrem ante mim
e meu espírito se abre em consonância á minha boca,
que de poesia têm ânsia.

Sabemos pouco mas somos muito.