domingo, 29 de maio de 2011

Ruína

Minha ruína foi ter despertado naquele quarto, em meio à minha própria solidão.Sou um alguém vazio, cheio de tabaco e café no sangue, com preocupações fúteis sobre a vida e morte. É uma quarta feira e estou em meu quarto, nos sonhos e aspirações de outra pessoa, que certamente me ama, porém não me conhece ou nunca me encontrou antes.
Não falarei aqui sobre o que não importa: Meu nome, quem sou, a que gênero pertenço. Me veja como uma pessoa arruinada, apenas isto é o que importa...
Como as quartas feiras teimam em ser dias importantes em minha vida aparentemente
sem propósito, minha ruína aconteceu numa quarta feira fatídica no ano de 1976, enquanto
pesquisava não sei o quê, talvez mais um assunto não muito relevante ( críticas de Faust talvez ?) quando
caí em sono profundo, na cova rasa da meu ser.
Qual a importância desse sonho ? Não me lembro. Não me lembro ainda do próprio sonho, seu
conteúdo, as vestes que usou. Não me lembro se gostei do sonho. Não me recordo de eu estar no sonho,
não me recordo de nada. Só me lembro de mim. Recordando o nada...
Abri os olhos, observei a realidade, como quem ouve um rouxinol, e se apaixona. Ergo meus
olhos como quem contempla a Deus. No meu caso não era diferente.
Eu havia acordado. Desperto, com a vida engatilhada para o meu cerébro. Ela se põe incólume
em minha frente. Total, desgraçadamente, total e inefável. Vejo minhas mãos, quase em posição
de súplica, já fatigadas pela idade. Vejo como alguém que espera a morte.
Acordo. Eis aqui, minha ruína.
Sou arruinado, porque existo.

domingo, 22 de maio de 2011

Nostalgia no exílio da alma - Capítulo 2.

No alto da montanha é onde vivo, onde ninguém me vê, ou ouve minha voz. Posso contar a estúpida e ditosa história de minha vida curta, mas algo mais importante me interrompe nesse momento, em que recebo estranhas visitas, acho que são alemães, vestidos em belas armaduras, em belos Alasões que vêm perguntar...

"És tu o que veio para Trair e Mentir, és tu quem mataste teus próximos e arruinaste teu país ?"

Essa foi a pergunta, e é claro que eu saberia responder

"Muito prazer, mas o mais importante é : quem sois vós, destemidos cavaleiros ?"

Num instante, perco minha consciência. Noutro, estou com ela de volta, em outro lugar, de fronte a um rosto barbado e com ar de autoridade, em uma cadeira de madeira, com os dois cavaleiros ( alemães) ao meus lados...

Ao perceber o rosto do homem que me encara, eu tremo, talvez de uma estranha felicidade, mas o mais provável seria medo.Sim, o cavaleiro de coração Irascível também sente medo, e ainda mais medo dos mortos. E para mim, aquele homem deveria ser um homem morto.

E quem havia matado-o era eu, quando combatia sua Jyhad...
Sim, eu fui um Cruzado, e um Cruzado Honrado. Apenas nunca consegui ser alguém de compromisso com minha fé.

Minha bravura suplantava isso, como disse antes, traí os Cristãos porque queria lutar. Queria o sangue e o calor da batalha...
E é claro, os muçulmanos foram traídos por mim, quando venciam de novo a batalha.

E pelo que me lembro, o capitão das tropas islâmicas que me olhava no momento, já esteve com o fio de minha espada em seu coração...


Como que um raio suas palavras saíram acompanhadas de saliva, e eu ouvia atentamente à tudo

Contemplando fundo de garrafas

Posso saber o que está atrás desta mesa,
posso contemplar o mistério do que há dentro desta roupa,
consigo definir o que há dentro do reflexo do reflexo do espelho ?

Então porque escrevo ? Se minha tarefa é contemplar,
é evidenciar o mundo. suas sensações...
Como posso poetar, se o poeta me é estranho ?

Simulo um mundo
finjo emoções,
atuo sofrimento.

O mundo que aqui lhe apresento sou eu,
e nem sei o que sou, e se eu o soubesse,
o que saberia ?
Será que saberia ? Será que conheceria...


E a unica contemplação verdadeira é aquela feita ao fundo de uma garrafa,
a da loucura e do ébrio, a unica epifania verdadeira é aquela que se trata das mentiras...


sexta-feira, 20 de maio de 2011

Eu, a morte, e o pós-morte

Eu, a morte, e o pós-morte. Essa era a minha situação, no volante daquele Impala preto, à caminho do nada, numa estrada desconhecida com uma mulher no banco de trás, a mulher que amo, desmaiada.
Estou surpreso por estar vivo. E consciente...Tudo começou subitamente e poderia acabar subitamente .
Bom,na verdade, tudo já acabou, eu tento recomeçar... O maldito carro está quase sem gasolina, eu estou quase sem balas, e ainda existem algumas daquelas criaturas por aí, nas estradas.Não são bem criaturas, porque estão mortas, bem, não sei como chamá-las, só sei que os mortos deram para sair de suas tumbas, para matar mais gente.Não sei o que causou isso, só espero sair dessa vivo, se é que isso é possível.

Ao redor da morte, eu e minha amada, que agora está em meus ombros, caminho por pastos verdejantes ( enfim a gasolina do carro acabou), em busca de pessoas, abrigos, ou até lugares em que eu possa morrer em paz. Enfim encontro uma velha capela, onde posso descansar e colocar o belo corpo de minha mulher ao meu lado, em uma banco qualquer daquela igreja.

Ela é tão bela, tão simpática, pena que teve que ver o fim do mundo, pena que teve que passá-lo comigo, pena que foi atacada.
Será que é pena por ter sido salva ?
Ainda bem que ela está inconsciente, se bem que quase não sinto sua respiração.
Não, ela vive, mesmo que esteja morta, ela vive.

Comprovo isso enquanto ela me morde no pescoço, buscando minha carne viva.
Logo logo estarei com ela na eternidade, e nossos corpos na terra, devorando outros corpos.


Mistério

A água caía sobre meus ombros,
que carregam o sofrer de um homem comum,
toneladas de labuta, toneladas sem propósito aparente,
aparente, somos aquilo que a alma sente.
Minha alma sente apenas a morte.
Minha alma, mal sente.
Do outro lado da rua, a chuva atingia outra pessoa,
a morte estava em sua alma também.
Sua alma estava na rua, despojada,
molhada, arrebatada por um sentimento
que transcende o corpo, o tempo,
enfim, aquele homem amava...
Amava, não pela primeira vez, não na melhor das vezes
amava como quem captura um pássaro e ele lhe foge as mãos
mas mesmo assim, ainda há a esperança de recuperá-lo.
Ele se perdeu, mas iria se encontrar,
isso é o amar, se encontrar quando estar perdido
eu amei, mas não me encontrei.
Não
na verdade, nunca amei.

Caminho, flutuando, andando, pensando
vivendo, sendo, esquecendo, matando,
difamando, eu caminho. E no meio caminho,
os meios de minha vida, os meios dos meus fins,
vêm a tona, e tudo parece claro, na chuva, o sol me queima por dentro,
não aguento a dor, a dor de saber, o pungir da verdade.
Alcanço a faca mais próxima, acabar com minha vida,
com o sofrer, não queria contemplar o mistério.
Sem sucesso, eu morro, e o mistério se abre como uma flor na primavera,
diante dos meus olhos, tristes, vermelhos, enfim,
mortos.




domingo, 15 de maio de 2011

O relembrar traz apenas escuridão e ressentimento.Fui um fracassado, e no ato de fracassar mais uma vez, fracassei de novo.Fracassei, ao tentar fracassar a estúpida tentativa de ser eu mesmo.
Um vício que se impregnou em mim. O vício de ser. E não apenas ser, como ser eu mesmo.Nas montanhas em que vivo, observo os rochedos e contemplo minha consciência.
Os rochedos são menos intransigentes...


Nos meus anos de glória, eu lutava em nome do meu país.
Isso era uma completa mentira.
Lutei pelo gosto de lutar, meu coração irascível não podia exultar mais do que a guerra, quando pude trair à todos, eu os traí.

Tudo pela contemplação a bravura, coragem e ao furor das batalhas...


Desejos d'alma

Que deseja a alma mais veementemete do que a verdade ?
Eu desejo mais do que a verdade.
Desejo a verdade despida,
desejo-a nua, crua, inegável, infalível,
Mas não desejo apenas a verdade.

Minh'alma deseja algo que a verdade não é.
Só quero uma mentira,
quero uma ilusão,
desejo mais do que tudo,

Embriagar-me a ponto da verdade não importar.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Vitae

A lúgubre lua pairava no céu
De testemunho à vida do homem,
seu alumiar cobria todo o seu ser,
sua corrupção e seus amores,
sua vida e suas dores

Todo ele, por menos possível,
a lua brilharia, veria,
ouviria todo o seu cantar,
ignoraria o desespero de seu gritar,
e sorriria, enquanto te visse amar.

Do começo ao final, da luz à escuridão,
até a morte, o grán finale,
por um sonho, hoje adormecido,
onde a lua, o lume da dúvida,
dá lugar ao sol, que a Verdade e Virtude brilha.


quarta-feira, 11 de maio de 2011

Nostalgia no exílio da alma - Capítulo 1.

Me sinto culpado por tudo que fiz, enquanto vejo todos ao meu redor morrerem. Estamos sendo massacrados. Toda a esperança morreu, e com ela a vida vai junto. Sinto que meu lugar no reino do céus não existe.

Antes de ver a derrota final, tudo aquilo por que lutei desmoronado como um castelo feito na areia, peço perdão, em silêncio.
No silêncio de minha culpa, eu fui salvo.
Quem diria, que depois de morta, a esperança pode ser ressuscitada ?


Sempre necessitei de misericórdia.No momento em que lutava aquela última luta, mais ainda.


Mas isso foi outrora.

Hoje permaneço desconhecido, onde minha vergonha não me alcança, e meus atos nunca serão lembrados.
As palavras que saem de minha boca são ouvidos por poucos.Nunca permanecem no ar, depois de exaladas, nunca mais serão relembradas, ditas ou exaltadas...


O que deve saber de mim ? Sou um homem exilado. Procurei ser um exilado, primeiro, exilado na alma.Esquecer quem fui.Saber apenas o que serei.Depois, exilei meu corpo, partindo paro o interior da Espanha.

Nos meus tempos de glória, fui marido, soldado, amante, guerreiro e um homem conhecido.

Hoje sou apenas um decadente.Para muitos, morto. Remoendo uma vingança que talvez nunca aconteça.









domingo, 1 de maio de 2011

Darkside

"Minha sombra me acompanha desde então, nos meus sonhos, com as pessoas que conheço, em tudo"

Arfando e esbravejando, lá estou eu brigando novamente com minha esposa.Esse sou eu, não a minha sombra, que me ataca tenazmente, quando estou só.
Ela é boa comigo, me dá conselhos, me ensina como não ser.

A dor invadiu-me, ela estava vindo (matematematematematemate), sua voz estava rouca nessa manhã, a maldita consegue me dominar.

Parto para cima de minha amada esposa com os dedos abertos, prontos a alcançar seu lindo pescoço.Ela cai diante de mim, num desmaio belíssimo.
Alcanço a cadeira ao meu lado e atinjo o corpo desfalecido da mulher que me deu um filho.

A cadeira se quebra em pedaços, assim como as costelas de minha esposa.
Saio de casa, com cigarro na boca, marcas da briga em minhas mãos.Nenhuma culpa em meu coração.

Quando acordo desse pesadelo, estou em uma cama, com quatro mulheres.
Não é a primeira vez que isso acontece.Corro desesperado até minha casa.

Vejo meu filho, chorando, ao corpo de sua mãe, ela não sobrevivera.




Minha sombra me apodera desde então, nos meus sonhos, com as pessoas que conheço, em tudo